Há matérias que todo bom
jornalista gostaria de assinar, exemplares pela ousadia, competência e coragem
de seus autores e editores. Em "10 reportagens que abalaram a
ditadura" – livro que abre a coleção Jornalismo Investigativo da Editora
Record – Fernando Molica reúne algumas das melhores reportagens produzidas num
dos piores momentos de nossa história. São trabalhos que se destacam em meio à
grande e mesmo surpreendente quantidade de ótimas reportagens publicadas numa
época pouco propícia para o exercício do jornalismo.
Mas o livro faz mais que
republicar esses escritos. Agora as reportagens voltam a circular acompanhadas
dos relatos dos jornalistas envolvidos na sua produção e edição. Uma combinação
emocionante como as próprias pautas. Os textos escolhidos oferecem um painel
sobre o período que vai de 1964, ano do golpe que destituiu o presidente João
Goulart, até 1985, quando o último general deixou o poder. "Foi buscada
também uma certa variedade temática, reportagens que abordassem diferentes
aspectos da vida nacional em um período de exceção", comenta o
organizador.
Vistas assim, em
conjunto, as reportagens permitem uma nova leitura do regime militar e de
algumas de suas conseqüências que mais chamavam a atenção dos jornalistas e da
sociedade. Os temas nelas abordados – tortura, corrupção, pobreza – formam
quase o resumo de uma agenda que se impôs ao longo de duas décadas e que, em
alguns casos, permanece constrangedoramente atual.
Estão compiladas a série
pioneira sobre tortura publicada no Correio da Manhã, o alerta para a fome
brasileira editada na revista Realidade sob o título de "Eles estão com
fome", a denúncia da banalização da tortura e sua adoção como método de
interrogatório, em edição especial da Revista "Veja", num dos
períodos mais duros da ditadura.
"10 reportagens que
abalaram a ditadura" traz, também, reportagens sobre a morte de
Vladimir Herzog, a descoberta da "Casa da Morte" em Petrópolis, os
abusos cometidos com o dinheiro público, o direito de acesso a documentos
públicos, o caso Riocentro, trabalhos de Marcos Sá Correa e Márcio Moreira
Alves e outros. Um mergulho no passado, não muito distante, fundamental para o
entendimento do Brasil contemporâneo.